A sustentabilidade tende, hoje, a ser entendida como um dos pilares da transformação digital, mas existem vários desafios que têm colocado à prova a compatibilidade entre o digital e a sustentabilidade. Estará o nosso entendimento a ir ao encontro do significado do amplo conceito de transformação/desenvolvimento sustentável?

Regulação, racionalidade e conversão podem ser a chave para uma verdadeira transformação?

Vejamos: se aplicarmos a definição da Organização das Nações Unidas (ONU), que define o desenvolvimento sustentável como a capacidade de “suprir as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades”, podemos notar a amplitude do conceito. Em primeiro lugar, precisamos de clarificar que o campo do desenvolvimento sustentável assenta em três pilares (crescimento económico, conservação ambiental e preocupação social) e que estes devem estar implícitos no processo de transformação digital de qualquer empresa.

Assim, também a transformação digital deve ser pensada em torno de três vértices: a empresa e os processos que estão a ser transformados; o que vem otimizar; e quem a vai usar. Aí surgem os três desafios que referi no início: a regulação, a racionalidade e a conversão. Racionalidade no sentido em que, quando falamos de processos de transformação, temos de pensar na sua sustentabilidade financeira, mas também na sustentabilidade social em relação ao público que queremos atingir. Isto leva-me a afirmar que não podemos fazer mudanças radicais, sob o risco de desfalcarmos grande parte da população.

É facto que temos casos de sucesso, inclusive no setor público, que têm vindo a ser trabalhados paulatinamente, como é o caso do IRS automático. Falamos, aqui, de uma implementação que foi programada e instituída de forma segmentada, ou seja, um caso de implementação racional.

Por outro lado, e em outros setores, é preciso tornar possível – em termos de regulação – que a digitalização aconteça. Simplesmente não é sustentável que existam áreas do setor público a avançar com a digitalização se, depois, nos deparamos com outras que, por imposição legal, têm que ter os documentos impressos fisicamente. Isto é tão válido para o setor público como para o privado. E é aqui que nos deparamos com a incompatibilidade entre a sustentabilidade e o digital. Uma vez mais, reforço que, ainda que possa ser regulada, só através de uma transformação programada e segmentada, poderá ser um caso de sucesso.

Por fim, o tema da conversão, que se relaciona não só com o retorno da transformação em investimento para as empresas, mas com outro ponto que se relaciona com a capacidade de transformação de postos de trabalho e skills. Como sabemos, a área das tecnologias de informação está a sofrer uma crise de escassez de perfis, motivada por diversos fatores, designadamente, por estarmos, talvez, no mercado de trabalho mais global que existe – para além de todos os fatores demográficos que são do conhecimento de todos nós. Em paralelo com a evolução tecnológica, começaram a verificar-se necessidades que não existiam. A indústria automóvel, por exemplo, se no passado tinha os seus principais talentos na área da engenharia mecânica, hoje tem também uma boa parte do conhecimento na área tecnológica e com tendência crescente. Para acompanhar as revoluções digital e verde que estão a acontecer, precisamos de transformar processos, pessoas e conhecimento. O reskill faz parte das prioridades, pois só através deste processo teremos equipas polivalentes, em que o conhecimento é a chave do sucesso.